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Circuito (1998)

Para o artista a estrutura da máquina deixou o mundo do cotidiano e entrou no repertório de imagens poéticas.

 

Marjorie Perloff 


Aos poucos as letras voltaram a se insinuar no trabalho. as últimas pinturas com letras foram em 1988. Certas questões reaparecem, e indicam uma circularidade na produção. as letras aparecem aqui como um indicador “poético”, que mostra o “grau de energia” de cada traço, ou fio condutor dos transformadores. 


Waltércio Caldas realizou uma série de trabalhos com fios coloridos, como em sandback, muitas vezes o fios estão no espaço sem qualquer estrutura que os sustente a não ser o teto ou a parede. por terem cores diferentes, os fios se apre-sentam no espaço de maneira diversa. pensava nestes trabalhos quando pintava os circuitos. No meu caso, os traços com diferentes matizes criam um espaço dife-renciado na tela. Mas é como se eles aludissem a um espaço tridimensional. 


A trama entre os vários circuitos nasce muitas vezes quando os quadros são pintados na posição horizontal. Tenho a impressão de ter mais liberdade quando trabalho deste modo, pois uma tela branca na posição vertical sempre reitera uma forma específica no espaço, sugerindo muitas vezes o enquadramento de uma janela. Como pretendo criar uma articulação entre estruturas e cores que desafiem o formato da tela, procuro me afastar das convenções da janela clássica. os problemas reaparecem no trabalho apresentando sempre novos desafios. as formas que surgem da trama articulam planos diversos. Traços cromáticos não só contornam o vazio, como apresentam os objetos como se estivessem emanando uma luz no crepúsculo. ao reiterarem sua capacidade construtiva, as pinturas-máquinas realizam o papel anteriormente atribuído ao pintor. a utilização de imagens de máquinas na arte moderna tende a mecanizar a maneira pela qual se faz uma obra de arte, “despersonalizando” o processo criativo e ocultando o sujeito.


As “máquinas” são um meio e não um fim para a pintura. pode-se notar certa ironia no fato de que alguns planos cromáticos estarem aparentemente sustentados por ganchos. Mas estamos aqui longe do humor sarcástico de picabia, que em uma de suas máquinas, propõe a destruição do futuro. Elas não ilustram uma plataforma de ação dadaista. as manchas cromáticas muitas vezes sugerem imagens de transformadores elétricos, máquinas que transformam energia, que metaforicamente podem ser interpretadas como a imagem da própria pintura: além de emanar luz, será que a pintura pode ser entendida como uma tecnologia de transformação das imagens do mundo urbano? 

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